LOCAL ESTÁ ÀS RUÍNAS
Hotel abandonado em Salvador era desmanche antes de ocupação; veja imagens
Portal A TARDE foi ao local e conversou com pessoas do grupo, que tem até quarta-feira, 4, para deixar imóvel
Por Andrêzza Moura

Já ava das 17h desta segunda-feira, 2, quando a reportagem do Portal A TARDE teve o às ruinas do Hotel Sol Bahia Atlântico, na Rua Manoel Antônio Galvão, em Patamares, bairro nobre de Salvador, a poucos metros da orla.
Ao entrar no local, além de muita destruição e sujeira, encontramos homens, mulheres, idosos e crianças unidos em uma 'força-tarefa' na tentativa de deixar o ambiente em condições habitáveis. Não existe nem água, nem iluminação elétrica no prédio.

O grupo, que está no prédio desde o sábado, 31 de maio, faz parte do Movimento Social de Luta por Moradia e Cidadania da Bahia (MSMC) e, segundo um dos diretores, Carlos Alberto Araújo dos Santos, ocupou o espaço para reivindicar das autoridades condições de moradia melhores.
Durante as quase duas horas em que a reportagem esteve no imóvel, foi possível ver, a todo tempo, pessoas retornando do trabalho e veículos chegando com mudanças.

"Este movimento não luta apenas por moradia, mas pela dignidade, inclusão social, qualificação profissional e orientação psicossocial. Aqui, em sua maioria, são mulheres negras, solteiras, mães, mães de filhos especiais, idosos. Então, é uma classe de mulheres sofridas, que moravam, na verdade, estavam morando ou tentando morar em áreas insalubres, com periculosidade, em áreas de enchente. São mulheres que vieram para esse espaço na tentativa de viver melhor", afirmou Santos, revelando que o movimento acolhe cerca de 600 famílias de vários bairros de Salvador.

A aposentada Maria José dos Santos Nunes, 65 anos, é uma dessas mulheres. Ela chegou ao local no sábado acompanhada dos três netos, o estudante universitário Arthur Gabriel Nunes Santana, 20 anos, e os irmãos dele, Sophia, de 9, e Miguel, de 4. Dona Maria revelou que, além dela, os netos precisam tomar remédios controlados. Eles moravam em Itapuã.
"Estou na ocupação porque, além de ser idosa, sou diabética, hipertensa, tenho o benefício do Loas [Benefício de Prestação Continuada - BPC/ LOAS], que não dá nem para pagar meu aluguel e comprar meus remédios. Pago aluguel caro, compro remédios todo o mês, compro remédio para meu neto que tem problema com epilepsia, tem problemas com ansiedade e com o sono, ele só dorme se tomar os medicamentos. Estava sem condições de pagar o aluguel, já estava para ser despejada. Meu neto menor é autista e a menina tem TADH [Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade]", contou a senhora o motivo pelo qual está no prédio.

A dona de casa Patrícia Souza Santos, 41, morava no Bairro da Paz, antes de ocupar um dos quartos do segundo andar do imóvel. Ela também chegou ao local, no sábado, acompanhada da filha pequena, de 4 anos, e do marido. Assim como os demais vizinhos de ocupação, carrega no peito a esperança de morar em um lugar melhor.
"Estávamos precisando. Temos sete pessoas em uma casa muito pequena, onde eu não tinha o direito legal de convivência. Aí abriu essa oportunidade de a gente estar guerreado para ter uma moradia melhor, um lugar com mais espaço, onde nossas crianças possam ter mais liberdade", explicou a mulher.

"Peço a Deus que venha nos abençoar, que eles [proprietários e Justiça] venham nos deixar, aqueles que estão tentando nos derrubar, nos envergonhar, dizendo que somos vândalos. Que venham poder entender que somos famílias, trabalhamos, nós somos honestos e estamos aqui guerreando, trabalhando para conquistar um lugar melhor na sociedade e na cidade", concluiu Patrícia.
Abandono e desmanche de carros

Carlos Alberto revelou que, há um ano, o prédio vinha sendo monitorado pelo movimento e que, só após verificar que as dependências estavam abandonadas, decidiu por ocupá-las.
"Os donos têm uma rede de hotéis. Os verdadeiros donos faleceram e deixaram seus herdeiros e eles, por sua vez, abandonaram. Porque, inclusive, aqui tem uma questão jurídica de documentos falsos. Então, nós levamos aqui um ano levantando a situação do hotel. A gente fez aqui vários voos com drone, futucando espaço por espaço", explicou o diretor.
Ainda de acordo com ele, durante as investigações, descobriu que hotel havia sido invadido por um homem de prenome Nilton e que o espaço estava servindo para fazer desmanches de veículos.
"Tivemos a informação de que aqui tinha sido invadido. Invadido por quem? Por um cidadão chamado Nilton, que se diz procurador autorizado a defender a causa [a família]. Ele se aproveitou tendo as informações privilegiadas e aqui ele se instalou para seu próprio benefício e instalou uma oficina clandestina. Tem vários carros, onde ele desmanchava um e fazia outro. Só que ele achava que ninguém iria descobrir", afirmou Carlos Alberto.

Em um pátio grande e em um galpão, que fica trancado, a reportagem registrou imagens de vários veículos, reboques, carrocerias, um capó e alguns motores. Outros equipamentos também foram filmados no ambiente.
Carlos Alberto contou que, no sábado, dia da ocupação, foi conduzido à Central de Flagrante da Polícia Civil, onde registrado um boletim de ocorrência pela invasão.
"O portão estava aberto. Conversamos com o rapaz que se dizia porteiro e ele autorizou todo mundo a subir. Como é que é invasão? Invasão não se dá dessa maneira. E aí eu fui convidado para me dirigir até a delegacia. Foi feito um boletim de ocorrência que se transformou num processo, onde o juiz quer dar uma liminar para desocupar e desproteger essas 600 famílias que aqui estão", lamentou o líder.
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A defesa do hotel e a reintegração de posse
Em conversa com o Portal A TARDE, o advogado Paulo Vieira, representante da ANAK Consultoria Imobiliária S/A, empresa responsável pela istração do prédio, onde o Hotel Sol Bahia Atlântico funcionou até 2020, período da pandemia do Covid-19, falou que o imóvel nunca esteve abandonado e que, inclusive, atualmente, o local abriga uma oficina de veículos e o almoxarifado, onde estão guardados os móveis do empreendimento. Ainda segundo Vieira, 20 pessoas trabalham no local.

"Eles toda hora inventam alguma coisa ilícita para justificar o ilícito que eles estão cometendo. Quando houve a invasão, eles, estrategicamente, deixaram para o final de semana, onde não tem funcionários, só tinham dois colaboradores que tomam conta do imóvel. Ameaçaram eles, coagiram e entraram, inclusive tinha facões, arma branca", declarou o defensor.
"A polícia compareceu no local, constatou a situação, levou o líder, eu não sei se ele é um líder ou se ele é um laranja, ou se diz líder, para a central de flagrantes. Foi instaurado o inquérito, o pessoal que estava, os funcionários que foram coagidos, foram ouvidos, e a partir daí, com tudo registrado, a gente imediatamente ingressou com a ação de reintegração de posse no plantão judiciário. Essa reintegração foi deferida pelo juiz, que determinou um prazo de 72 horas para que eles desocupem o local", afirmou o advogado. Prazo termina na quarta-feira, 4.
Desocupação
Para o diretor Carlos Alberto, não há nenhuma possibilidade de os ocupantes deixarem o imóvel. A intenção é aguardar uma posição da Prefeitura de Salvador e do Governo do Estado.
"Estamos tentando dialogar com o governo para que a gente sente na mesa discuta o tema. A decisão dessas famílias aqui é só sair daqui quando o governo disser: 'olha, eu tenho um lugar melhor para vocês'. Enquanto não tiver, dois, três, quatro, cinco anos que precisar, esse povo vai ficar aqui", defendeu Carlos Alberto.
A reportagem entrou em contato com a Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (SEINFRA) e com Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Sedur) para saber se havia alguma reunião agendada com o grupo, mas, até a publicação dessa reportagem, não obteve retorno.
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